Uma das muitas coisas impressionantes que se vê ao visitar a Air Venture, em Oshkosh, é a quantidade em pleno solo americano de aeronaves de países do que era antes conhecido como Cortina de Ferro. Todos voando de forma regular por proprietários americanos. Sem falar nos Mig-15 ou Mig-17, há uma profusão de Aero L-39, projeto de jato de treinamento avançado da então Tchecoslováquia fazendo apresentações de deixar ruborizadas as bochechas de muito general da época da Guerra Fria. No meio dessa frota sempre chama a atenção uma máquina de formato bem peculiar, na verdade por conta de seu trem de pouso. O Yakovlev Yak-52 é um treinador biposto em tandem que voou pela primeira vez em 1976. Ele é descendente direto do Yak-18, que surgiu na metade dos anos 1950 e de quem herdou o conceito de trem de pouso que recolhe, mas ainda fica exposto. O Yak-52 foi proposto como um treinador básico, todo metálico. Grande, ele usa um motor radial Vedeneyev M-14P de nove cilindros e 360hp, o mesmo dos Sukhoi de acrobacia e também usado no Pitts Model 12. A hélice é uma PZL de madeira e forrada de material plástico. No nariz dá para ver a persiana que protege o motor do clima gélido encontrado nos países da antiga União Soviética, aqui basicamente é usada fechada para aquecer o motor na primeira partida. Outra curiosidade, o radiador de óleo que fica debaixo da asa direita sempre é mantido aberto e o que você controla é a saída de ar, não a entrada frontal para fazer a refrigeração. Sua estrutura de construção é bem robusta, tanto para aguentar as porradas do cotidiano do ensino de novos pilotos, como também para passar incólume pelas condições operacionais naquela parte do globo. Os trens de pouso são enormes, com rodas grandes calçadas por pneus estreitos, bom para operar em pistas de pouco preparo.

Os sistemas de acionamento de flapes, trem de pouso, partida do motor e freio são todos pneumáticos. A cabine, tanto na frente como atrás, é bem espaçosa. O instrutor vai no assento traseiro, e por meio de um painel que fica na lateral direita da cabine consegue manipular diversas panes. Ele pode tirar o velocímetro, o giro direcional para aplicar o treinamento ao aluno. O Yak acionado e taxiando, soa como caminhão, com o barulho da atuação das válvulas pneumáticas. O acionamento dos freios é feito na mão, igual bicicleta. Nos pedais a válvula fica no meio, e quando se atua um lado ou outro, essa válvula vai mandar o ar para o lado que se deve atuar o freio fazendo o direcionamento do avião. Olhando para o painel, é sempre lembrar que o velocímetro está em quilômetros por hora, a altura está em metros e outro ponto importante é o horizonte artificial, que trabalha de forma invertida de como se está acostumado a ver. Memorizando isso, basicamente qualquer manicaca vai fazer esse avião decolar e pousar. Claro, a finesse vem com o tempo. Quer dizer, isto se ele também condicionar que devido a hélice girar anti-horário vai ter que inverter as atuações de pedal. Na decolagem, para compensar o efeito do torque, é o pé esquerdo que tem que ser aplicado e ele pede um bocado disso nessa fase do voo. O avião é ridicularmente dócil na decolagem e pouso, parece um Tupi com mais motor. Nas aproximações ele deve ser trazido com 140km/h para cruzar a cabeceira com 120km/h (75mph). Em voo ele mostra comandos leves. Se fosse comparar com algum outro acrobático, o Yak-52 seria um Super Decathlon com mais energia, pois ele tem mais motor que o asa alta de pano e cano. Continuando com a comparação, os ailerons do Yak-52 apesar de não serem a maior leveza que você achará no mundo, são confortáveis, um pouco mais duros que os do Super Decathlon de comando. Quando em velocidade eles são um pouco mais pesados que o profundor. O Yakovlev mostra harmonia de atuação maior nos pedais em relação ao profundor. Aplicando o flape, que é ventral, não há registro de tendência de alteração de ângulo de ataque, mas é percebido o arrasto que o dispositivo provoca.

Se comparar com um radial bem conhecido aqui, o North American T-6, o Yakovlev é bem mais leve de peso e motor, mas é bem mais manobrável. Em contrapartida não dá para comparar com um Sukhoi de acrobacia, que possui o peso de comandos muito mais leve. Neste, qualquer pedal dado em excesso vai querer fazer um giro. Nas acrobacias a velocidade de entrada para fazer um looping, hammerhead ou perna de oito é de 300km/h. Se entrar no looping com 250km/h ele até faz a manobra, mas fica meio bobo e dá para perceber que a hélice, que parece mais dois remos, entrega muita tração e devido ao sentido de giro desta, os hammerhead e giros de tunô são melhores para a direita do que para a esquerda. Nas manobras verticais é bom seguir bem embalado, pois é um avião meio pesado para os 360hp. Vazio ele pesa 1.015kg. Num campeonato de acrobacia o Yak-52 faria bonito seguramente na categoria Esporte e até na categoria Intermediária, isto se o piloto estiver com o pé e mão bons. Lá fora tem campeonatos só com os Yak. O bom também é que o Yak-52 tem sistema de lubrificação para voo invertido. No manual diz lá que dá para manter assim por dois minutos. Também pelo manual é um avião para aguentar cargas de +7/-5G e em alguns modelos dá para perceber o reforço estrutural ao longo das longarinas para aguentar algo mais. Lá fora existe Yak-52 com cones de hélice e motores de 400 a 450hp. Alguns colocam até tanques de combustível sub-alares com capacidade de pelo menos 60 a 70l cada, o que vai dar uma autonomia extra na casa de 2h em regime econômico. O Yak-52 das fotos de número de série 86.7007 é quase um avião novo. Fabricado em 1986 tem apenas 916h totais e o motor passou recentemente pela revisão geral. O sucesso entre os pilotos americanos está no seu baixo preço. Lá existem ofertas de US$ 70 a 80 mil. Para navegar dá para fazer etapas gastando entre 70 a 75l/h (em acrobacias o consumo vai a 90-95l/h) e ele é muito mais confortável que um Pitts Special, Christen Eagle ou o próprio Sukhoi e é possível abrir a cabine e seguir viagem como num conversível. Na conta de padaria, aqui a hora de voo calculando dois litros de óleo e mais os 70l de cara gasolina, sairia em torno de R$ 1.500,00. Mas é um avião que lhe cobra algumas atenções. Se ele voa pouco, o conselho após a diversão é tirar e reservar todo o óleo, remover as velas e não girar a hélice. Lá fora os americanos têm usado um kit com uma válvula que fecha o caminho do óleo da parte de cima do motor para a inferior e ainda colocam uma bomba de retorno para facilitar a vida. Esses trabalhos de procedimentos de manutenção podem ser um preço bem baixo pelas alegrias que esse avião pode retribuir. No chão ele chama atenção pelo desenho inusitado. Decolando o som é bem chamativo e para voar é uma delícia de outro mundo.

Ficha técnica

Yakovlev Yak-52
Fabricante: Yakovlev Design Bureau
Motor: 1 Vedeneyev M-14P de 360hp
Capacidade: 1 piloto + 1 passageiro
Envergadura: 9,3m
Comprimento: 7,74m
Peso vazio: 1.015kg
Peso máximo de decolagem: 1.305kg
Capacidade de tanques: 122l
Velocidade de cruzeiro: 190km/h
Alcance: 550km