Família Energia
Progressão Tecnológica
A Embraer deu mais um passo dentro do seu projeto Energia, assim mesmo, escrito em português. A nova família de aeronaves que usam meios de propulsão alternativa com muita eletrificação foi apresentada há um ano e parte para uma segunda definição. Do anúncio feito em 2021, foram estudadas 20 configurações de projetos iniciais até chegar em 2022 num funil contendo modelos com capacidade entre 19 e 30 assentos.
Os projetos de menor porte com capacidade de nove passageiros e mais voltados para a aviação executiva e geral foram para a gaveta, ficando os projetistas concentrados no segmento que fez a Embraer grande do mesmo jeito que ela fez quando trabalhou em cima dos Bandeirante e Brasília, desenvolvidos mirando a criação, a partir dos anos de 1970, do então novo nicho de mercado das linhas aéreas regionais. Depois de definidos os projetos iniciais eles pretender focar as atenções na ampliação da família com modelos de 50 assentos. Alguns tópicos servem de justificativa para o desenvolvimento desses novos produtos. A Embraer já detectou um aumento e uma evolução da aviação regional impulsionada pelo incremento do trabalho remoto. Cerca de 70% dos empregados estão trabalhando em casa pelo menos uma vez por semana após o período mais profundo da pandemia do Covid-19. Aliado a essa possibilidade de trabalho remoto, as pessoas estão se deslocando para cidades menores em busca de melhor qualidade de vida, descentralizando a economia das comunidades das grandes metrópoles. Ao comparar os anos de 2019 e 2022 foi registrado um aumento em 20% nessas migrações.
Nesse cenário foi criada a demanda por deslocamentos rápidos entre cidades, em 2022 foi acusado o aumento de 25% nos voos fretados em relação ao ano de 2019 e a população desenvolveu outro hábito, o de preferir tirar férias em destinos mais próximos de suas casas. Segundo a Embraer, algo como 32% preferem que as suas viagens de férias tenham esse formato ante 14% que preferem destinos longe de seus domicílios. Um novo mercado pode estar surgindo com uma malha aérea atendendo localidades distantes entre si de 200 a 500nm (320 a 800km). Só que é um mercado tão fragmentado, com fluxo de passageiros menor, que cada centavo conta. É imperativo ser eficaz. Essa aviação regional precisa de custos operacionais bem menores, item mais levado em conta pelas empresas aéreas ao analisar a compra de uma nova aeronave, seguido pelo alcance que possibilite a maior flexibilidade de uso, o suporte pós venda e credibilidade do produto e fabricante. Uma das formas pensadas para alcançar tal eficiência, rentabilidade além de se enquadrarem num mundo mais sustentável, foi a eletrificação. Os modelos de 19 e 30 lugares da atual proposta da família Energia podem ser impulsionadas com motorização híbrida elétrica com alcance de até 500nm ou com células de hidrogênio e alcance de 200nm, resultando quatro opções no catálogo. Nas motorizações híbridas, os turboélices serão otimizados para o voo de cruzeiro e vão receber a ajuda extra de potência de pequenos motores elétricos instalados nas próprias naceles em situações como decolagens e pousos. No taxiamento a proposta é de ser usada apenas a eletricidade.
Os motores que funcionam com hidrogênio, segundo a Embraer, podem ser mais eficientes que pequenas turbinas atualmente encontradas na aviação. Ainda são conceitos, mas as versões com conjunto híbridos elétricos estariam disponíveis no mercado em 2030 enquanto que as opções com motores que funcionariam com células de hidrogênio entrariam em serviço em 2035. Para a vida do passageiro, comparando uma viagem de 200 a 300nm de carro elétrico versus uma nova aeronave de 30 lugares que use células de hidrogênio, de carro essa viagem pode demandar 5h45m custando US$ 175,00 e emitindo 33,7kg de carbono por passageiro. No avião a viagem pode durar 2h11m, o custo será de US$ 130,00 e a emissão de carbono por passageiro será de 25kg. Além de ser 2,5 vezes mais rápida a viagem será 25 % mais econômica e de menor emissão de carbono. A Embraer só não considera os tempo gasto nos eventuais atrasos dos voos ou tempos perdidos nos deslocamentos aos aeroportos (que pode ser menor considerando as cidades menos populosas e com menores problemas de trânsito). Mas há outros benefícios a serem considerados como a do passageiro ao escolher o voo, dependendo da ocasião, não precisar fazer pernoites do destino por conta de uma viagem mais demorada e cansativa se feita de carro. Em termos de sustentabilidade, a combinação de turbinas convencionais com motores elétricos pode reduzir de 30% a emissão de carbono se queimar querosene normal ou até 90% se usar combustível sustentável de aviação, que em determinados casos, chega a ter óleo de cozinha reciclado como matéria prima.
Esse índice nos motores que usam células de hidrogênio é de zero emissão de carbono. A eficiência chega até na aerodinâmica. A escolha pela colocação do conjunto propulsor no cone da cauda liberou a engenharia a desenhar uma asa com desenho mais limpo e eficiente. Assim, segundo a Embraer, seus aviões poderão ser rápidos em velocidades de cruzeiro e ao mesmo tempo ter boa performance para operar em pistas mais curtas, típicas de cidades pequenas. No modelos de hidrogênio chama a atenção uma entrada de ar à frente do leme, à lá Boeing 727. Ela coleta a maciça quantidade de ar necessária para refrigerar as células de hidrogênio instaladas na região da fuselagem entre os pilones do motores. Esse fluxo de ar depois de fazer a sua função de arrefecimento, serve como tração ao sair pela parte final do cone de cauda. É o mesmo esquema que foi usado no radiador ventral do P-51 Mustang da segunda guerra. O posicionamento dos motores na traseira da aeronave (como todas com esse tipo de engenharia) também serve para a redução de ruído na cabine de passageiros.
Para quem estiver do lado de fora, a Embraer promete aviões cerca de 60% mais silenciosos que os atuais modelos de porte semelhante quando equipados com conjuntos motriz híbrido elétrico e até 70% menos barulhentos se forem os de células de hidrogênio. A bordo a cabine vai ser uma verdadeira repaginada ao padrão que era encontrado nos Brasília e ERJ com fileiras de assentos em configuração 2+1, porém serão usados mais materiais sustentáveis na construção e é esperado uma maior conectividade a bordo. A nova família Energia quer ser o recado da Embraer para mostrar ao mundo que ela é uma empresa de vanguarda e quer ser a catalizadora para uma nova noção de mercado. A escolha de propulsão tem também relação com o momento que tais tecnologias são no momento mais eficazes e indicadas para aeronaves de raio de ação mais curto do que modelos de maior porte. O tal novo turboélice da Embraer, concorrente dos ATR na categoria entre 70 a 90 assentos, e que tem desenho geral semelhante ao conceito da família Energia, com motores colocados na traseira, ainda deve funcionar, mesmo usando combustível alternativo e mais sustentável, de forma convencional, a princípio sem eletrificação. Com a prevista aceleração na renovação de frotas nos próximos 20 anos, essa é a grande aposta da Embraer. Como ela fez em seu início de carreira.